"Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos"

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07/04/16

Era uma vez...




Era uma vez uma menina que gostava de sonhar cores e luares, cheiros e fantasias. Certa vez, um menino chegou até ela e levou-a a ver as estrelas e o céu onde morava a noite. Assim, a partir dos dois mundos criaram um só mundo, um mundo só deles, onde as serpentinas fizeram uma escada em espiral, um acesso escondido nas dobras da noite, que dava acesso a uma partitura de que só eles conheciam a música. Seguiram-se dias de descoberta dos mundos opostos e dos seus encantos, das suas cores e sabores que divergiam apenas por fora, porque por dentro eram iguais. O menino todos os dias segurava no seu papagaio de papel e com ele fazia danças e sinais à menina dos seus sonhos. Corria com as nuvens e pousava num raio de sol de onde lhe acenava com as mais belas palavras, e com elas compunha estórias mil, onde a menina era sempre uma princesa vestida de azul e mar. Então, ela, ao receber as palavras feitas estórias, subia ao arco-íris das cores e colhia as mais belas, que depositava à porta do menino, para lhe dizer que lhe dava o infinito. Mas, um dia, o menino ao correr atrás do seu papagaio deixou-o enredar-se numa frondosa árvore que se colocou no seu caminho e ele ficou muito tempo a tentar desembaraçá-lo e deixou de enviar sinais dos seus bailados, embora, por vezes, atirasse um frágil avião de papel, mas este não tinha a graciosidade do papagaio nem percorria tão largas distâncias. E a partir desse dia, inexplicavelmente, o arco-íris deixou de dar todas as cores, ficou a pairar, suspenso em azul. A menina, sem saber o que fazer, atirava pedrinhas ao menino, envoltas no azul que restara, e assim foram passando os dias e as cores, mas nunca os sabores, nem as estrelas, embora a noite se tenha tornado mais lenta e se demorasse mais na janela da menina, até que o sol irrompesse e a fizesse regressar ao seu céu, o sétimo. E enquanto Chronos olhava os ares, o menino corria por serranias e alturas, e a menina passeava junto ao mar, não sei se desfolhando flores, se em litania com o oceano, “mar me quer”, dizia em voz ausente, perscrutando os céus em busca de um papagaio de papel. Mas, eis que um dia, não avistou o desejado papagaio, mas recebeu um presente do menino, em tons rosa, com uma fitinha, e dentro o mais belo presente: as palavras que tinham perdido o brilho e que renasciam uma a uma. Estas não formavam uma estória, mas sim um pequeno ramo de vogais e consoantes, que, por sua vez, formavam pequenas palavras iluminadas com a luz das estrelas. A menina, então, procurou no arco-íris e encontrou de novo todas as cores e foi ela quem, por sua vez, construiu uma estória onde o papagaio e todas as cores do universo poderiam voar e ganhar altura, visitar o céu, mas também a terra… “Mar me quer”


 Custódia Pereira (Professora de Português)

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