Uma conta de somar
sensível às coisas belas
pôs-se a contar as estrelas
numa noite de luar.
Estava ela a olhar o céu
somando infinitamente
quando uma estrela cadente
luziu e desapareceu...
Com uma parcela cadente
não estava a conta a contar!
Que fazer? Passar à frente?
Contá-la? Não a contar?
Fazer de conta que não
se dera conta de nada?
Mas, e depois, a adição?
Não daria conta errada?
E quando ela fosse dar
contas à prova dos nove?
Ia a prova acreditar
em parcelas que se movem?
E a conta achou-se a contas
contemplando o céu sereno
com um problema terreno
difícil de resolver.
A solução que encontrou
foi terra-a-terra também:
quando um problema não tem
solução já se solucionou...
E, contas feitas, a conta
decidiu fazer de conta...
Estava a contar estrelas,
não a tomar conta delas!
Fingiu, pois, que não deu conta
da escapadela da estrela,
afinal a vida dela
não era da sua conta!
Só que enquanto fazia
tais contas à conta dela
a manhã amanhecia
e apagavam-se as estrelas.
Nasceu o sol, fez-se dia,
e o quadro negro do céu
aonde a conta fazia
contas desapareceu...
Nunca antes uma conta
teve tanto que contar
como a conta de somar
que quis contar as estrelas!
Manuel António Pina, Pequeno Livro da Desmatemática
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